Como já deve ser de conhecimento, tivemos no último dia 05 a publicação no DOU da LEI COMPLEMENTAR 190/22, a qual regulamenta e estabelece a legalidade constitucional quanto a exigência do DIFAL – Diferencial de Alíquotas do ICMS, no que diz respeito às operações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto.
(https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/lei-complementar-n-190-de-4-de-janeiro-de-2022-372154932 )
Primeiro ponto de questionamento que surgiu foi quanto ao início de vigência da referida norma que regulamenta a possibilidade jurídica de exigência do DIFAL pelos estados.
Nos termos do art. 3º da referida LC 190, esta não deixa margem de dúvidas de que a sua produção de efeitos somente se dará a partir de 90 (noventa) dias de sua publicação (Art. 3º Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação, observado, quanto à produção de efeitos, o disposto na alínea “c” do inciso III do caput do art. 150 da Constituição Federal.)
Contudo, não podemos deixar de lembrar que a LC em questão visa, justamente, legalizar e chancelar legalmente a exigência do DIFAL pelos Estados, o que, por outro lado, permite concluir, que exigências tributárias anteriores à norma se mostravam ilegais e inconstitucionais, pela ausência de Lei Complementar que validasse essas operações pretéritas como anotado pelo STF na decisão que permitiu a cobrança apenas até 31.12.21.
Com isso, permite-se concluir, sob certo enfoque, que a LC em questão trataria de instituir – ou melhor -, autorizar legalmente a tributação, sob operações que antes eram assim realizadas sem amparo legal ( por convênio) , resultando assim em um aumento de tributação legalmente validado e instituído.
Isso acaba por atrair a alínea “b” do inciso III do caput do art. 150 da Constituição Federal, o qual prevê que é vedado aos entes públicos em todas as suas esferas cobrar tributos no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou.
Ou seja, nessa tese, o DIFAL somente poderia ser exigido em 2023 (tese da anualidade), sendo que existem argumentos nesse sentido para sustentar a validade de sua cobrança somente em 2023, contrariando o que vem dizendo om COMSEFAZ e que sustenta a legalidade da cobrança de forma imediata sem respeitar a anterioridade nonagesimal prevista na própria lei e a anual, segundo eles por não se tratar de novo tributou ou aumento de tributo, mas sim partilha entres os Estados.
Portanto, cremos que os Estados não respeitarão essas premissas, tendo interpretação divergente com enfoque arrecadatório em si e não sob o ponto de vista legal.
Certamente Estados que editaram leis estaduais antes da LC 190, e antes mesmo da virada de 2021/2022, como SP e PR deverão sustentar que o DIFAL já pode ser exigido em 2022, pois editadas as referidas normas estaduais antes do presente exercício, ressalvada a noventena mais acima referida, já que, partindo-se da premissa de que a eficácia dessas leis estatuais dependia da edição da LC 190, estas ficariam atreladas ao prazo de 90 dias fixado nesta norma.
Ainda, os Estados devem defender que não teria havido um aumento de imposto, e sim, como dito, apenas uma regulamentação pela cobrança mesmo que ilegal e inconstitucional que já existia. Contudo, esse entendimento não se sustenta, uma vez que o STF julgou inconstitucional o DIFAL sem regulamentação por LC, o imposto que era exigido não existia sob plano legal (era inconstitucional na origem), e nesse caso, entendemos que sim, que houve um novo imposto a partir da criação da LC, o que pode atrair a anterioridade anual para cobrança levando a legitimidade para cobrança para 2023.
Para Estados que tenham se antecipado e que com a declaração de nulidade do convenio confaz que instituiu o DIFAL e já o incorporaram a seus regulamentos de ICMS (RICMS), sem avançarmos de modo demasiado na complexidade jurídica, o STF já posicionou, em situação pretérita, que a norma estatual que edita normas de obrigações tributárias em sede de ICMS, e que dependam de Lei Complementar para sua validade, não seriam inconstitucionais, mas somente possuem eficácia retida, até a edição da referida Lei Complementar exigível.
Portanto, como no caso de SP e PR, que editaram leis prevendo o DIFAL após a decisão do STF reconhecendo a necessidade de LC, eles vão sustentar que essas leis estaduais são válidas, contudo, somente serão eficazes após o início de vigência da LC 190 (RECURSO EXTRAORDINÁRIO 1.221.330 SÃO PAULO e Tema 1094 do STF)
Então, restam as seguintes situações:
– Aplica-se a noventena da lei estadual citada ou da lei complementar a que a Lei Estadual fica vinculada como sua condição de eficácia? – aplica-se a anterioridade anual e a noventena ou apenas a noventa em favor dos contribuintes
– E os estados que ainda não editaram leis a respeito do DIFAL?
Portando, a questão ainda suscitará dúvidas, que demandarão o posicionamento de cada ente federativo, onde concluímos:
a) Aqueles Estados que já editaram normas a respeito assunto antes de 2022, mas após a Decisão do STF em repercussão geral sobre o caso, e ainda, que estejam em harmonia com a LC 190, estas seriam válidas, mas unicamente teriam a sua eficácia dependente da edição da LC 190, com base no que dispõe o RE 1221.330 e tema 1094 do STF citado acima.
Dúvida permanece quanto ao prazo de sua vigência, que ficaria ao nosso ver vinculada à eficácia da LC 190, ou seja, começando a vigorar em abril, conforme art. 3º da LC 190. A anualidade restaria preservada, pois editadas as normas em 2021.
a.1) Mas cabe aqui uma ressalva de tese que pode pela via judicial ser exercitada e levar a cobrança para 2023, qual seja, se considerarmos como um novo tributo e se for observado que no texto da própria Lei Complementar 190 muito embora a Constituição não o impusesse, o próprio legislador – em decisão política que privilegia a segurança do contribuinte optou por submetê-la ao “disposto na alínea c do inciso III do caput do artigo 150 da CF” , vide (art. 3 da lei), isso impõe a espera de 90 dias e a observância cumulativa da alínea b do citado artigo da CF que prevê a exigência cumulativa da anterioridade anual.
Assim, como não tivemos veto desse artigo pelo presidente e nem pelo Congresso como poderia e como e a lei foi sancionada somente em 2022 , certamente essa tese poderá ser defendida em Juízo para sustentar a exigência do DIFAL somente em 2023.
b) Leis editadas antes da Decisão do STF em repercussão geral sobre o caso seriam inconstitucionais e assim, inválidas.
c) Lei estaduais editadas em 2022, somente poderiam exigir o DIFAL em 2023.
d) O Convênio ICMS Nº 236 DE 27/12/2021, publicado em 06 de janeiro, apenas trata de procedimentos, não afastando a necessidade da regulamentação da exigência do DIFAL por cada unidade federada, considerando que a LC 190, estabelece que “§ 5º A apuração e o recolhimento do imposto devido nas operações e prestações interestaduais de que trata a alínea “b” do inciso V do caput do art. 11 desta Lei Complementar observarão o definido em convênio celebrado nos termos da Lei Complementar nº 24, de 7 de janeiro de 1975, e, naquilo que não lhe for contrário, nas respectivas legislações tributárias estaduais.”
Ou seja, demanda a regulamentação específica pelos Estados que ainda não editaram normas após o Julgamento do STF.
Há ainda outros destaques: a Lei Complementar 190 modificou o formato de cálculo do ICMS-Difal, elevando a carga tributária em certas situações e destinos Estados). A forma adotada viola o disposto na Constituição Federal, que determina que o DIFAL deve ser apurado apenas com base na efetiva diferença entre as alíquotas interestadual e interna do destinatário. O STF inclusive já se posicionou quanto a possibilidade de exigência de diferenças que não sejam as efetivas.
Assim, além do DIFAL os contribuintes podem ter de se voltar em relação a demais mazelas de regramentos internos de Estados. Nesse sentido, vide a Lei Paulista 14.470 publicada no final do ano que alterou a base de cálculo do Difal do ICMS, impondo o cálculo por dentro o que deixa de espelhar o valor da operação como prevê a LC 87-96 e o STF https://www.conjur.com.br/2021-dez-21/lei-paulista-altera-calculo-icms-stf-dizem-advogados
Ante o exposto, nosso entendimento é pela possibilidade de exigibilidade do DIFAL, apenas a partir a 01/04/2022, e ainda com boas chances em alguns casos de reconhecimento da anterioridade anual levando a cobrança para 2023 .
Quanto os demais prazos, tudo dependerá de como a legislação estadual de cada unidade federada tratará o caso em sede de regulamentação local e de como os entes federados vão passar a se posicionar em relação a essa cobrança, cabendo aos contribuintes ficarem atentos e preparados para os embates em cada Estados, para se for o caso, judicializar garantido a noventena e a também a anterioridade anual.
Nossa equipe, como sempre, permanece a disposição para as repercussões desse tema, bem como para adotar as medidas judiciais cabíveis.