Em meio a casos de vazamento de dados em massa no Brasil, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) tem sido alvo de diversos projetos de lei no Congresso. Pelo menos 10 propostas de alteração foram articuladas desde 2019.
Os PLs visam alterações das datas de aplicação das penalidades e multas previstas pela LGPD, permitir que determinados setores não precisem seguir as normas da lei, entre outros temas. Uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) em tramitação tenta incluir a proteção de dados pessoais entre os direitos e garantias fundamentais na Constituição Federal.
Atualmente a LGPD está em vigor, entretanto as penalidades e multas administrativas previstas na lei só podem ser aplicadas a partir de agosto de 2021. Na prática, a data representa uma “corrida” para que empresas e o setor público se adequem às novas exigências. Parte dessa corrida também teve reflexos no Congresso, e dois PLs propõem o adiamento da aplicação das penalidades.
O PL 5762/2019, por exemplo, prorroga a entrada em vigor de dispositivos da lei para agosto de 2022. A proposta é do deputado federal Carlos Bezerra (MDB-MT). Segundo o texto da proposta, que atualmente aguarda parecer da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), seria necessário um maior tempo para a adaptação total do mercado às exigências da LGPD.
A justificativa do PL assevera que a LPGD traz benefícios à sociedade, entretanto “apenas uma pequena parcela das empresas brasileiras iniciou o processo de adaptação ao novo cenário jurídico”. “Se nem mesmo as grandes corporações já estão preparadas para lidar com os desafios introduzidos pela LGPD, para as pequenas empresas o quadro certamente inspira ainda mais preocupação, sobretudo neste momento de grave turbulência econômica que o Brasil atravessa hoje”, indica o texto.
O PL 500/21, de autoria do deputado federal Eduardo Bismarck (PDT-CE), tem o mesmo objetivo. Entretanto, o texto da proposta adia a possibilidade de aplicação das penalidades administrativas para 1º de janeiro de 2022. A proposta foi apresentada no dia 19/2 na Câmara dos Deputados.
Atualmente, a LGPD prevê punições de até 2% do faturamento da empresa, com limite de R$ 50 milhões nas multas aplicadas. Apesar das penalidades, o presidente da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), Waldemar Gonçalves Ortunho Junior, afirmou, em entrevista ao JOTA, que o objetivo inicial da autoridade não será a aplicação de multas, mas a orientação ao mercado para a criação de uma cultura de proteção de dados.
Entrada em vigor imediata
Por outro lado, o PL 578/21, de autoria da deputada federal Erika Kokay (PT-DF), estabelece a entrada em vigor imediata dos dispositivos de multa da LPGD. Segundo a justificativa da proposta, a conformidade imediata com a LGPD “será um diferencial para as organizações, por promover a credibilidade pelo uso responsável de dados pessoais e pelo respeito à privacidade de clientes e parceiros”.
A deputada acrescenta na justificativa que, diante de diversos incidentes de vazamento de dados em 2021, o objetivo do PL é “assegurar a implantação prática e urgente de uma lei que tem se mostrado fundamental no Brasil”. A proposta foi apresentada à mesa diretora da Câmara em 24 de fevereiro.
Constituição e Privilégios
Além do adiamento da entrada de vigor de dispositivos, os congressistas também propuseram outros projetos com base na LGPD. A PEC 17/2019, por exemplo, pretende incluir a proteção de dados pessoais entre os direitos e garantias fundamentais na Constituição Federal e fixar a competência privativa da União para legislar sobre proteção e tratamento de dados pessoais.
A PEC foi aprovada em plenário pelos senadores e aguarda votação na Câmara dos Deputados. A justificativa da PEC assevera que a proposta promove, caso aprovada, “a racionalização do tratamento de dados no país e sua inclusão na realidade internacional da disciplina da matéria”.
O PL 5141/20, por outro lado, estabelece que o tratamento de dados para fins religiosos não deve seguir as normas da LGPD. A proposta é de autoria do deputado federal Alex Santana (PDT-BA).
Ele defende que, diante da garantia constitucional prevista no artigo 5º, VI, da Constituição Federal, que assegura o livre exercício dos cultos religiosos, “há uma necessidade de se estender as hipóteses exclusivas de aplicabilidade da citada norma para os procedimentos adotados pelas organizações religiosas ao campo religioso”, explicou o parlamentar na justificativa do PL. A proposta aguarda parecer da CCJ.
Já o PL 365/2020, de autoria do deputado federal Ricardo Izar (PP-SP), exclui das regras da LGPD as entidades filantrópicas. Como contrapartida, as entidades precisam manter campanhas para arrecadação de fundos para manutenção de suas atividades.
“Acreditamos que seria absurda a necessidade de solicitar autorização a alguém para pedir’, ou seja, que a entidade filantrópica, antes de pleitear um donativo, tivesse que requerer a permissão ao doador em potencial para enviar-lhe um pedido de doação”, defende o deputado no PL. A proposta aguarda designação de relator na Comissão de Seguridade Social e Família.
Insegurança Jurídica
Segundo Marcela Mattiuzzo, sócia do VMCA Advogados, a grande atenção gerada pela LGPD no Congresso Nacional ocorre por conta do regime parcial da lei, ou seja, o fato de partes da norma ainda não estarem em vigor. “Consequentemente, isso gera alguma ansiedade e insegurança nas empresas, na sociedade civil e no próprio governo”, explicou.
Na análise da advogada, há PLs que são positivos para o tema de proteção de dados, mas outros que são “puxadinhos” e causam insegurança no mercado.
“A PEC 17/2019, por exemplo, é claramente positiva. Ela constitucionaliza a proteção de dados no país. Ao mesmo tempo temos um PL que posterga a aplicação de penalidades para 2022 e outro que pretende entrar em vigor imediatamente. Isso gera insegurança. É um desafio para a ANPD e para o governo”, afirmou Mattiuzzo.”
Fonte : www.jota.info.com.br “